Hoje, partilho convosco, um artigo, escrito por mim e que originalmente foi publicado na Revista Paleo XXI nº2
Conhecido, também,
como “líquido de ouro”, o leite materno é o alimento mais completo que existe e os benefícios para a saúde tanto dos bebés, quanto das mães são inúmeros e
irrefutáveis.
Citando James Akré: “O leite humano é muito mais do que uma
simples colecção de nutrientes, é uma substância viva de grande complexidade
biológica, ativamente protectora e imunomoduladora. Não apenas proporciona
protecção exclusiva contra infecções e alergias, como estimula o desenvolvimento
adequado do sistema imunológico do bebé, além disso, contém muitos componentes
anti-inflamatórios”
Apesar de a Organização Mundial de Saúde e a UNICEF recomendarem a amamentação exclusiva até aos seis meses de idade, seguida de amamentação parcial até pelo menos dois anos de idade, a verdade é que isso muitas vezes não acontece. Segundo o Manual de Aleitamento Materno, do Comité Português para a UNICEF, «alguns estudos portugueses apontam para uma alta incidência do aleitamento materno, significando que mais de 90% das mães portuguesas iniciam o aleitamento materno». Em contrapartida, «esses mesmos estudos mostram que quase metade das mães desistem de dar de mamar durante o primeiro mês de vida do bebé, sugerindo que a maior parte das mães não conseguem cumprir o seu projeto de dar de mamar, desistindo muito precocemente da amamentação». É, por isso, extremamente importante deitar por terra inúmeros mitos e crenças sem qualquer base científica que as sustente e que muitas vezes assombram e comprometem irremediavelmente o sucesso da amamentação bem como o aporte nutricional e o bem-estar psicológico da mãe. Eis alguns dos mitos mais frequentes:
1- Leite Fraco
Estudos mostraram que mesmo mulheres desnutridas são capazes de produzir
leite materno em quantidade e qualidade suficientes para suprir o crescimento
do bebé. A incapacidade de produzir leite suficiente
(hipogalactia materna) é muitíssimo rara. Na maioria dos casos, problemas com o ganho de peso do
bebé estão, sim, relacionados com a baixa ingestão de leite - não mamam em
livre demanda ou fazem “má pega” o que dificulta a ingestão correta do leite –
ou com um problema de saúde do bebé.
Quando o bebé tem o seu primeiro pico de crescimento e o seu apetite
aumenta substancialmente, solicitando leite “a toda a hora” muitas mães e até
alguns profissionais de saúde mal informados, entendem isso como sinónimo de
leite fraco e correm a introduzir os famosos suplementos, tal não é de todo
necessário, tudo o que a mãe tem que fazer é continuar a amamentar em livre
demanda SEMPRE que o bebé pedir. Nunca esquecer que quanto mais bebé mama, mais
leite a mãe produz.
O apoio de alguém especializado em amamentação é fundamental para encontrar
a causa que está de facto a impossibilitar o ganho de peso do bebé, por forma a
impedir a suplementação incorreta e consequente possibilidade de desmame
precoce.
2- Bebés
devem mamar de 3 em 3 horas
Os bebés devem mamar em “livre demanda”(quando e sempre que
querem). Intervalos irregulares entre mamadas são normais. Factores como a
dimensão do estômago do bebé ( quando nascem é normal quererem mamar de hora em
hora) picos de crescimento, sede, calor, doença podem influenciar a frequência
com que mamam, bem como a quantidade ingerida.
Para além disso alguns bebés têm necessidade
de mamar frequentemente e durante muito tempo e outros mamam mais espaçadamente
e fazem mamadas mais curtas. Cada bebé tem a sua maneira pessoal de
alimentar-se e sentir-se confortado.
A produção e a ejeção do leite são mecanismos
controlados principalmente por duas hormonas: a prolactina e a ocitocina. A
prolactina é responsável pela produção do leite, enquanto a ocitocina é
responsável pela saída do leite.
Quando o bebé mama, o mamilo emite impulsos
nervosos para o cérebro da mãe, provocando a libertação de prolactina e de
ocitocina. A prolactina é produzida em maior
quantidade durante a noite, pelo que amamentar o bebé durante a noite pode
contribuir para uma boa produção de leite.
3-Quanto
mais espaçadas as mamadas, maior a quantidade de leite “armazenada” nas mamas
A lactação é um processo neuro-hormonal que envolve caminhos
neurais intactos e é ativada, ainda mais, pela ação mecânica da demanda de
leite do lactente. Portanto, quanto mais frequente e eficiente o tempo que um
bebé mama, maior é a resposta do corpo para produzir adequadamente leite e
aumentar o seu teor de gordura.
4- O leite materno não tira a sede ao bebé
Estudos indicam que bebés saudáveis
e amamentados em exclusivo, nos primeiros seis meses de vida, não necessitam de
ingerir líquidos adicionais, mesmo em países com temperaturas muito altas e
baixa humidade. Os níveis de solutos na urina e no sangue de bebés exclusivamente
amamentados em tais condições situavam-se dentro dos valores normais, indicando
ingestão adequada de água.
A quantidade de água do leite materno consumida
pelo bebé amamentado em exclusivo satisfaz todas as suas necessidades. Muito
embora, inicialmente, o recém-nascido obtenha pouca água com o colostro, não é
necessária ingestão adicional porque os bebés nascem com uma reserva extra de
água e por volta do terceiro ou quarto dia, surge o leite com maior teor de água.
Para além disso, substituir o leite materno por
um líquido com nenhum valor nutricional pode ter um impacto negativo na sobrevivência,
crescimento e desenvolvimento do bebé. Mesmo o consumo de pequenas quantidades
de água ou outros líquidos pode encher o estômago do bebé e consequentemente
reduzir a quantidade ingerida de leite materno. Estudos mostram que dar água
antes dos seis meses pode reduzir a ingestão de leite materno em até cerca de
11 por cento.
5- Quando
as mamas estão moles é sinal de pouco leite ou que o leite secou.
A partir do momento em que a amamentação está
devidamente ajustada e regulada acontece frequentemente não ter a sensação de
mama cheia e por esse motivo achar que tem pouco ou nenhum leite. Esta situação
é normal e não é de todo motivo par alarme, a mama continua a produzir leite
sempre que o bebé mamar.
6- O leite
materno, à semelhança do leite artificial, tem sempre o mesmo sabor,
propriedades nutricionais e consistência
Estudos demonstram que o líquido amniótico e o leite materno
compartilham uma semelhança nos perfis de sabor com os alimentos que a mãe
comeu, levando a que o leite materno possa "encadear" as experiências
de sabores no útero com posteriores experiências com alimentos sólidos. Além
disso, a doçura e as propriedades texturizadas do leite humano, como a
viscosidade e o revestimento da boca, variam de mãe para mãe, sugerindo assim
que a amamentação, ao contrário da fórmula alimentar, proporciona à criança o
potencial de uma fonte rica de experiências quimiossensíveis várias. Os tipos e
a intensidade dos sabores experimentados no leite materno podem ser únicos para
cada criança e influenciar os seus gostos futuros.
7- Mamas pequenas não produzem leite suficiente
A capacidade de amamentar não é directamente proporcional ao tamanho da mama. O
seu tamanho apenas depende da gordura armazenada nesse local, ao passo que a
produção de leite depende das glândulas que se encontram na mama e que, em
geral, existem em quantidade suficiente em quase todas as mulheres.
8- A mãe deve lavar os
mamilos antes de amamentar
Durante a gravidez, as glândulas de Montgomery que rodeiam o mamilo começam a segregar um óleo natural que lubrifica a pele e inibe o desenvolvimento de bactérias. Basta deixar esta substância natural fazer o seu trabalho. Além disso, o próprio leite materno protege o bebé contra infeções e bactérias.
Enquanto mãe, vou tomar a liberdade de deixar
um pequeno conselho: É crucial que a futura mamã ou recém-mamã, se informe
corretamente, e caso seja necessário procure apoio junto de especialistas em amamentação.
Tenha à mão o contacto de uma CAM- Conselheira de Aleitamento Materno, não leve
chupeta para a maternidade, não esqueça a importância do colostro para o bebé
nos primeiros dias, promova o contacto pele-a-pele, acredite em si e nas suas
capacidade e ignore opiniões alheias. <3
Ps: Muito obrigada à querida CAM Patrícia Paiva por ter revisto este artigo <3
Autor: Ana G. (Mamã Paleo) - psicóloga e mãe
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Manual de Aleitamento Materno, do Comité Português para a UNICEF